domingo, 22 de outubro de 2023

Homenagem a fotógrafa e artista plástica Ciça Pereira morta em abril de 2023

Este poema escrito por ela emoldurou sua exposição fotográfica em outubro/2003


                   Antes que seja tarde

Andar no meio do mato na Serra do Cipó, 

Tomar banho de cachoeira em Aiuruoca,

Entrar numa gruta escura no Caraça,

Ver um mar de nuvens no Pico Bandeira,

Antes que seja tarde!


Olhar os centros urbanos,

mas curtir as pequenas cidades,

Preservar o ambiente natural,

Conhecer a história das " Minas Gerais ",

Antes que seja tarde!


Observar a cor de cada uma das flores,

Olhar o leito do rio, 

Combater a poluição,

Conversar com as crianças e adultos,

Sobre o  "Caminho Novo", 

Da antiga "Estrada Real",

Antes que seja tarde!


Sair às vezes só,

Caminhar com a máquina amadora,

Registrar o que lhe sensibiliza,

Alertar sobre o turismo displicente,

Ver que "ontem" era diferente,

Antes que seja tarde!


A vida, companheiros, é curta,

E às vezes nos  surpreende,

Por isso deixo de herança,

Para que fique na lembrança,

Estas fotografias...

Antes que seja tarde!


Ciça Pereira

Outubro/2003

              






                                       

iça Pereira                                                             

sábado, 6 de agosto de 2022

Revisitando o passado

 Ah, Rio Paraibuna, quem te viu quem te vê! No passado, nós pescávamos em seu leito, algumas pessoas divertiam-se pulando  de suas pontes e outras participavam de competições realizadas pelo Clube Naútico.

Ah, você mais parecia um menino travesso correndo livre, sem limites a transbordar. Talvez acostumados com suas peripécias, fizessem com que os juiz-foranos ignorassem o alerta do jornal local "Espera-se, hoje, nesta cidade uma tromba d`água´".

E na véspera de Natal de 1940, o temporal caído no município de Santos Dumont provocou o transbordamento do Rio Pinho, um de seus afluentes. Vinte e quatro horas depois acontecia a maior enchente de todos os tempos em Juiz de Fora.

Logo após a tragédia, o Diário Mercantil publicava um tabloide sobre os estragos ocorridos na cidade,  suplemento, que foi entregue, em mãos, ao presidente Getúlio Vargas pelo deputado *Jarbas de Lery Santos e pelo jornalista Renato Dias. Essa ação, muito contribuiu para que Vargas decretasse uma suspensão por quinze dias de todas obrigações fiscais do município e a construção de casas para os desabrigados.

Não havia tempo a perder, imediatamente, o prefeito Rafael Cirigliano reuniu-se com a Comissão de Socorro às Vítimas e doou uma área do bairro Poço Rico e construiu cento e cinquenta casas, cujo morador responsável era o vicentino sr. Argemiro Medeiros.

Em meio a tanta desolação nasceu a Vila Furtado de Menezes. Primeiro recebeu o nome de Flagelo, devido ao acontecimento sofrido por seus moradores, o segundo Vila Proletária, pelo fato deles serem operários de diversos estabelecimentos na cidade, esse tenho registrado em minha certidão de nascimento.

No ano de 1947, a Prefeitura Municipal de Juiz de Fora doou à Fundação das Casas Populares do `Poço Rico mais duzentas e vinte casas, que foram colocadas à venda sob a responsabilidade do sr. Pedro P. de Paula. Os novos proprietários autodenominaram-se moradores das Casas Populares do Poço Rico, negando aceitar as denominações anteriores, surgindo, assim, o seu terceiro nome. 

Na década de 50 foi erguido um pomposo arco de concreto armado, que trazia inscrito o seu quarto nome bairro Nossa Senhora do Líbano. Embora, esse nome ainda conste da fatura fiscal emitida pela Cesama, Companhia de Saneamento Municipal; ele nunca foi reconhecido pela comunidade. Algumas pessoas contam , que com as mudanças de altura dos modelos de transportes coletivos e de cargas, a prefeitura demoliu o monumento. Até pouco tempo atrás, podíamos ver uma placa verde sob o poste,  Travessa Martinho da Fonseca, com a inscrição bairro Nossa Senhora do Líbano, que desapareceu sem que alguém soubesse de seu paradeiro.

Já a sua atual denominação, Vila Furtado de Menezes foi indicado pela Sociedade São Vicente de Paula  em homenagem a Joaquim Pedro Furtado de Menezes. Mas afinal, quem foi Furtado de Menezes? Ele foi um confrade vicentino conhecido como o Servidor do Pobre. Idealizador da obra Cidade Ozanam -BH e possuía uma longa folha de serviços prestados à causa católica.

Ah, que saudade do número105 da rua Furtado de Menezes. Na frente, o botequim de meu pai, Carlos de Morais, um líder comunitário. Em seu estabelecimento nasceu a ideia de construção da Sede Operária, local onde realizavam bailes para arrecadar dinheiro, que era revertido para fazer casamentos, funerais, comprar uniformes para o time de futebol e outras melhorias para o bairro. 

À noite, após o trabalho, alguns fregueses reuniam-se para contar causos de alma de outro mundo,  Mula-sem-cabeça, Saci e outros personagens apavorantes. Vou confiar a vocês, leitores, um segredo de família, contavam naquela época, que o marido de tia Mercedes, o sr. Francino, virava Lobisomen. Não quero assustar ninguém mas em noite de lua cheia, ele desapareciaaaaaa!!!! E nesse cenário, recebi informações valiosas, ouvi muitas histórias contadas por eles, que sem saberem teciam o meu universo cultural.

A nossa casa ficava geminada ao comércio. Fui alfabetizada no fundo do quintal em meio as galinhas, os porcos e as árvores onde eu pendurava de galho em galho extravasando toda a minha energia. Assim, como Paulo Freire," o chão foi o meu quadro negro; gravetos, o meu giz." Por isso, ao chegar à escola estava alfabetizada.

Quando a professora entrou na sala de aula, eu devorava o meu livro de leitura sob os olhos espantados dos meus coleguinhas. Saí da classe com a professora e o livro, acompanhada pelos olhares intrigantes como se tivesse aprontado uma traquinagem.

Fui conduzida ao gabinete da Madre Superiora Adelina, a quem tanto temia. Aquela mulher, de manto marrom e gola engomada, curvou-se e colocou-me em seu colo. Logo em seguida, pegou a grande Bíblia e pediu para que eu lesse um de seus trechos. Até hoje, não entendi o que se passou naquele recinto. Só sei, que fui promovida para uma sala mais adiantada.

A escola tinha postura conservadora e preconceituosa pois  selecionavam seus alunos dentro dos critérios "adiantados" e "atrasados". Não voltei mais para aquela classe e enquanto aguardava o meu material, deixava transparecer o quanto não cabia em mim. Mas como todo momento de glória é efêmero, o meu não poderia ser diferente, ao entrar em outra sala e perceber que todos liam. Custou-me adaptar à nova situação.

Iniciei um novo livro, por meio dele apaixonei-me por Cecília Meireles no troc...troc... de seus tamanquinhos, talvez porque usássemos tamancos e foi com Afonso Celso em sua poesia Amiguinhos do Gato, que escolhi o meu animal de estimação.

Depois, de um tempo, o imóvel foi vendido, comprou-se uma casa na rua Carneiro da Silva e o comércio transferiu-se para a rua São Judas Tadeu. Pouco senti com a mudança, pois a nova residência além do quintal, possuía um jardim com roseiras, dálias, margaridas e um pé de romã. Ao entardecer debruçava-me sobre o muro e divertia-me vendo os meninos brincarem de pique-bandeira, de esconde-esconde e de bolinha de gude. 

Os meus pais eram rígidos, tinha poucos amigos e passava a maior parte do tempo em companhia dos livros de Monteiro Lobato, dos Irmãos Grimm, de Christian Andersen, das Mil e Uma Noite, as fábulas de Esopo, de Daniel Defoe,  Jonathan Swift e tantos outros. E nesse entrelaçamento de leitura, eu nasci...leitora.

A minha vida limitava-se em casa, na escola e a ajudar o meu pai em seu comércio. Colecionava enciclopédias, em fascículos, que ficavam sobre o balcão para quem os quisessem ler. À tarde, eu e os fregueses, mais jovens, aguardávamos ansiosos a chegada de sr. Oswaldo, funcionário do Diário Mercantil, que nos trazia as notícias impressas da cidade e do sr. Ferreira, bancário, com o Jornal do Brasil que ampliava nossos horizontes. Este, sempre muito bem vestido de chapéu, com seu terno cinza, gravata listada. Tinha ares diplomático, falava mais de um idioma e nos incentivava a escrever para os consulados solicitando  prospectos, nos quais ganhávamos o mundo.

Ah... o tempo passou, daqui de minha casa avisto o velho Paraibuna, que segue indiferente como se nada tivesse acontecido. Que bom, que nossos familiares, apesar de toda desolação, confiaram e  acreditaram que dias melhores viriam. Hoje, estamos aqui, frutos da bonança cheios de histórias de infância e adolescência para contar e impregnados de saudades.
Essa foi minha história, aguardo a sua, conte para mim!

*  Nome que mais tarde foi dado ao ginásio construído pela comunidade  

terça-feira, 12 de maio de 2020

Dia Internacional do Enfermeiro/a


Deixo aqui a homenagem a enfermeira Alice Móra de Andrade, minha avó, que na década de 40, bravamente, lutou junto a comunidade de Santa Luzia para a erradicação do tifo. Recebeu várias homenagens em vida pelo jornal do bairro e também no livro  Cachoeirinha e Santa Luzia: a história do bairro de Mauro Coimbra nas páginas 33, 34, 71.



Em 29.03.2003 foi publicado no jornal Tribuna de Minas a Lei 10.416 de 28.03.2003 que dava o nome da enfermeira Dona Alice Móra Andrade a Unidade de Pronto Atendimento - UPA do bairro de Santa Luzia-JF/MG.



Texto tirado do livro  Cachoeirinha e Santa Luzia: A história do bairro de Mauro Coimbra, 1998.


Homenagem publicada no jornal Nosso Bairro, S.P.M. Santa Luzia.
















domingo, 8 de março de 2020

Indigente

Falta o pé,
falta a vida,
falta a fé.

E vai o homem,
desvalido e triste,
alheio e quieto,
rendido e frio.

Falta a casa,
falta o caso,
neste descaso

A guerra

Lá fora o dia,
lânguido e frio,
pálido e triste.
Aqui estou eu,
cética e sozinha.

Lá fora o homem, 
a guerra e o frio,
o caos e a fome.
E o mundo vazio.

sexta-feira, 6 de março de 2020

A chuva

Era verão,
o  dia estava cinzento
e anunciava o amanhecer.
Uma sensação fria invadiu o meu corpo,
não me contive, comecei a correr.
O vento se rebelava e desmanchava os meus cabelos.
Um misto de prazer invadiu o meu ser
e eu me senti molhada,
... começou a chover!

Exílio

Ah amigo, como dói,
saber a tua sorte.
Te ver neste canto,
saber do teu desencanto.
E não poder mais, encantar o teu canto.

Ah amigo, como dói.
Dói te ver neste canto,
jogado ao desencanto
e sem nada poder fazer.

Ah amigo, como dói.
Dói ter que ficar no meu canto,
vendo o teu desencanto.
Sem pelo menos poder,
acalentar o teu canto.